Câmara aprova PEC que restringe investigações e prisões de parlamentares

Representação da Câmara dos Deputados, com foco na cúpula e bandeiras do Brasil, simbolizando o poder legislativo.

Em uma decisão que gerou intenso debate e críticas, a Câmara dos Deputados aprovou, na noite da última terça-feira, 16 de setembro de 2025, uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que estabelece novas e mais amplas condições para a investigação e prisão de parlamentares. A medida, que contou com o apoio de deputados como Beto Pereira (PSDB), Dr. Luiz Ovando (PP), Marcos Pollon (PL) e Rodolfo Nogueira (PL), propõe que deputados federais e senadores só possam ser investigados e presos mediante o aval do próprio Congresso Nacional.

Apenas dois deputados federais votaram contra a controversa PEC: Geraldo Resende (PSDB) e Vander Loubet (PT). Outros dois parlamentares, Camila Jara (PT) e Dagoberto Nogueira (PSDB), não participaram da votação. A baixa adesão contrária à proposta sublinha a ampla aprovação da medida entre os membros da Casa.

Ampliação da Imunidade Parlamentar em Contexto Delicado

A aprovação desta PEC ocorre em um momento de crescente preocupação com a infiltração de organizações criminosas, como o Primeiro Comando da Capital (PCC) e o Comando Vermelho, em diversos setores da sociedade brasileira, incluindo a política, grandes empresas e o mercado financeiro. Nesse cenário, a decisão da Câmara de ampliar as prerrogativas dos parlamentares é vista por muitos como um movimento na contramão dos esforços de combate ao crime organizado e à corrupção.

A nova emenda à Constituição é considerada mais abrangente do que o antigo foro privilegiado previsto na Constituição de 1988, que foi significativamente restringido em 2001, após forte pressão da sociedade civil. Naquela ocasião, a mudança visava justamente a diminuir a impunidade e acelerar processos contra políticos.

O Que Muda com a Nova PEC

A Proposta de Emenda à Constituição aprovada condiciona não apenas a prisão, mas também a abertura de investigações criminais contra deputados federais e senadores. Além disso, a PEC busca dificultar a instauração de processos por improbidade administrativa, que são ações judiciais destinadas a responsabilizar políticos por desvios de recursos públicos e atos de corrupção. Tais ações são ferramentas cruciais na fiscalização da gestão pública e na recuperação de bens desviados.

O Cenário Legal Anterior

Até a aprovação desta PEC, a legislação brasileira previa que deputados e senadores podiam ser presos somente em flagrante delito e por crimes inafiançáveis, como racismo, estupro ou crimes contra o estado democrático de direito. Para serem processados e investigados, era necessário o aval do Supremo Tribunal Federal (STF), mas a abertura de inquéritos e o andamento de investigações preliminares não dependiam de autorização prévia do Congresso.

No que tange à improbidade administrativa, políticos alvos de tais ações podiam ter seus bens bloqueados e ser condenados pela justiça comum, sem a necessidade de tramitação no STF. Casos de crimes sem ligação direta com o mandato parlamentar, como assassinatos, também eram julgados fora do STF, a exemplo dos processos envolvendo o ex-deputado Chiquinho Brazão, acusado de ser o mandante do assassinato de Marielle Franco, e a ex-deputada Flordeliz, condenada pela morte de seu marido.

Impactos e Críticas à “PEC da Blindagem”

Com a implementação da nova PEC, o Congresso Nacional passa a ter o poder de ‘blindar’ seus membros de investigações, o que pode resultar em impunidade, especialmente em casos graves. A abertura de um inquérito contra um parlamentar, mesmo por crimes hediondos como assassinato, dependerá agora da autorização dos próprios colegas deputados ou senadores. Isso levanta preocupações de que parlamentares envolvidos em crimes possam permanecer impunes enquanto durar seu mandato.

O jornalista Josias de Souza, da Folha de S.Paulo, criticou a medida, afirmando que a “PEC da Blindagem” tem o potencial de transformar o Congresso Nacional em um “bunker do crime organizado”.

A aprovação desta PEC, com o apoio dos mencionados parlamentares – Beto Pereira, Dr. Ovando, Marcos Pollon e Rodolfo Nogueira –, é vista por muitos setores da sociedade e por especialistas em direito como um dos maiores retrocessos na história legislativa recente do país. A medida é interpretada como um enfraquecimento das forças de segurança e dos mecanismos de combate à corrupção e ao crime organizado, dificultando a responsabilização de agentes públicos.

A decisão da Câmara também reacende o debate sobre a ética na política e a percepção pública dos representantes eleitos. Em um contexto onde a confiança nas instituições é constantemente testada, a aprovação de uma medida que parece proteger políticos de investigações rigorosas pode aprofundar o ceticismo do eleitorado, especialmente quando discursos de fé e moralidade são frequentemente evocados por figuras públicas.

Evolução do Foro Privilegiado no Brasil

O foro privilegiado, ou foro por prerrogativa de função, é um mecanismo jurídico que determina que certas autoridades públicas sejam julgadas por tribunais específicos. No Brasil, a Constituição de 1988 previa um foro mais amplo, mas a pressão social e movimentos por maior transparência levaram a uma revisão em 2001, que restringiu as hipóteses de julgamento de parlamentares pelo Supremo Tribunal Federal (STF) apenas a crimes cometidos durante o mandato e relacionados a ele. A PEC recém-aprovada propõe uma expansão significativa dessa prerrogativa, estendendo-a a investigações e prisões, o que tem gerado debate sobre os limites da imunidade parlamentar e a igualdade perante a lei.

Publicar comentário