Desembargador se declara impedido de julgar recurso da prefeita sobre multas de radares em Campo Grande
Desembargador se declara impedido de julgar recurso da prefeita sobre multas de radares em Campo Grande
O desembargador Odemilson Roberto Castro Fassa, integrante do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul (TJMS), declarou-se suspeito para analisar um importante pedido da prefeita Adriane Lopes (PP). O magistrado alegou “motivo de foro íntimo” para não julgar a solicitação da chefe do executivo municipal que visa manter a aplicação e cobrança das multas geradas por radares e lombadas eletrônicas, mesmo após o término do contrato com o Consórcio Cidade Morena. Com a decisão de Fassa, o agravo interposto pela Agência Municipal de Transporte e Trânsito (Agetran) será agora submetido à análise do desembargador Paulo Alberto de Oliveira.
Histórico de Alinhamento com a Gestão Municipal
A decisão do desembargador Fassa de se afastar do caso chama atenção, uma vez que ele tem um histórico de manifestações favoráveis a pleitos da prefeita Adriane Lopes. Um exemplo notório dessa postura ocorreu na votação para homologar o acordo que concedeu um reajuste salarial de 66% à prefeita. Na ocasião, Fassa foi voto vencido, defendendo a proposta que visava validar a elevação do subsídio de R$ 21,2 mil para R$ 35,4 mil. A maioria do Órgão Especial do TJMS, no entanto, rejeitou o acordo, impedindo que futuras contestações judiciais sobre o aumento fossem barradas.
A Controvérsia das Multas e a Decisão Judicial Inicial
A questão central que motivou o recurso da prefeita Adriane Lopes é uma liminar concedida pela 2ª Vara de Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos. Essa decisão judicial determinou a suspensão imediata da cobrança e da aplicação de penalidades decorrentes das infrações registradas por radares e lombadas eletrônicas em Campo Grande. A base para a liminar é a ausência de um contrato válido entre a prefeitura e o Consórcio Cidade Morena para a operação dos equipamentos.
Conforme a determinação judicial, as aproximadamente 320 mil infrações aplicadas nos últimos 12 meses, período em que o contrato já estava expirado, deverão ser anuladas. Consequentemente, os valores já pagos pelos motoristas referentes a essas multas deverão ser restituídos, gerando um impacto significativo para a administração municipal e para os condutores.
O Recurso da Prefeitura e a Alegação de “Serviço Inédito”
Mesmo diante da falta de amparo legal para a continuidade da cobrança, a prefeita Adriane Lopes recorreu ao Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul. O objetivo do recurso é obter a suspensão da liminar, permitindo que as multas continuem sendo aplicadas e, mais crucialmente, que o pagamento mensal de R$ 5 milhões ao consórcio seja mantido. A solicitação da prefeitura persiste apesar de o contrato com o Consórcio Cidade Morena ter se encerrado em 5 de setembro do ano passado.
A situação é descrita como “inédita no serviço público”, pois representa a tentativa de manutenção de um vínculo de prestação de serviço sem qualquer formalidade contratual, seja por meio de um aditivo ou de uma renovação emergencial. A Agetran, em suas razões recursais, argumentou que as multas já haviam sido pagas e que os valores arrecadados foram rateados entre o Departamento Estadual de Trânsito (Detran) e um fundo destinado a campanhas educativas. Essa argumentação, de certa forma, sugere que os motoristas deveriam arcar com as consequências de uma gestão que o veículo de notícias classificou como “mambembe”.
Argumentos da Agetran no Agravo
No despacho publicado nesta segunda-feira (22), o desembargador Fassa detalhou os principais pontos levantados pela Agetran em seu recurso. “Em razões recursais (f. 01-37), em síntese, arguiu preliminar de ilegitimidade passiva. Defende a necessidade de chamamento ao processo do DETRAN/MS. No mérito, sustenta que a decisão ofende princípios do direito administrativo, notadamente a continuidade do serviço público, e que configurado o perigo da demora reverso, em razão de implicar em grave e irreparável dano à ordem, à segurança e à saúde pública”, registrou o magistrado.
O argumento de “perigo da demora reverso” implica que a suspensão das multas e a interrupção do serviço de fiscalização poderiam acarretar danos maiores à coletividade, como o aumento de acidentes e a desorganização do trânsito, justificando a manutenção da cobrança mesmo sem contrato formal.
Apesar de ter analisado os argumentos, o desembargador Odemilson Roberto Castro Fassa optou por se declarar suspeito por “motivo de foro íntimo”, declinando de sua competência para prosseguir na análise do agravo. Assim, a responsabilidade de decidir sobre o pedido de suspensão da liminar recai agora sobre o desembargador Paulo Alberto de Oliveira, que terá a tarefa de ponderar os impactos da decisão para a administração pública e para os cidadãos de Campo Grande.
Entenda o "Foro Íntimo" e o Cenário das Multas
O conceito de “foro íntimo” permite que um magistrado se declare impedido de julgar um caso quando há razões de ordem pessoal que possam comprometer sua imparcialidade, mesmo que não se enquadrem nas hipóteses legais de suspeição ou impedimento. Essa declaração não exige justificativa pública detalhada.
A controvérsia das multas de radares em Campo Grande surgiu após o término do contrato entre a Agência Municipal de Transporte e Trânsito (Agetran) e o Consórcio Cidade Morena, responsável pela operação dos equipamentos. A ausência de um vínculo contratual formal para a continuidade dos serviços gerou questionamentos sobre a legalidade das infrações aplicadas e a manutenção dos pagamentos à empresa.



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