Megaoperação Desvenda Rede Bilionária do PCC em Fraude de Combustíveis e Lavagem de Dinheiro

Captura de tela de mensagens de celular mostrando conversas sobre adulteração de combustível

PCC na Faria Lima: Revelado Esquema Bilionário de Fraude de Combustíveis e Lavagem de Dinheiro

Uma vasta e complexa rede criminosa, supostamente vinculada ao Primeiro Comando da Capital (PCC), foi desmantelada em uma megaoperação que revelou um esquema bilionário de fraude de combustíveis e lavagem de dinheiro. Documentos e vídeos exclusivos obtidos pela Polícia Federal (PF) detalham a sofisticação da operação, que ia desde a importação clandestina de produtos químicos até a atuação no coração financeiro de São Paulo.

As investigações apontam que a quadrilha possuía informações privilegiadas sobre as ações de fiscalização. Mensagens interceptadas pela PF demonstram que os integrantes do grupo criminoso eram notificados com antecedência sobre as operações, permitindo-lhes preparar-se ou até mesmo suspender suas atividades ilícitas para frustrar flagrantes e evitar prisões, conforme apurado em 31/08/2025.

As Sete Etapas do Esquema Criminosa

1. Importação Clandestina no Porto de Paranaguá

O ponto de partida do esquema envolvia a importação ilegal de substâncias químicas como metanol e nafta através do Porto de Paranaguá, no Paraná. Esses produtos, que deveriam ser destinados a indústrias químicas legítimas, eram desviados para um fim criminoso: a adulteração de gasolina e etanol comercializados em postos de combustíveis por todo o Brasil.

Evidências contundentes foram encontradas no aparelho celular de Rafael Renard Gineste, um empresário detido durante a operação. Mensagens trocadas entre Gineste e um indivíduo identificado como Thiago revelam a intenção de fraudar os combustíveis. Em uma das conversas, Thiago questiona: “Não dá pra fazer algo nessa gasolina pra render mais? E baixar o custo dela? Etanol, sei que podemos jogar um ‘m'”. A investigação da Polícia Federal confirmou que a letra “m” era um código para metanol, um aditivo perigoso e proibido para essa finalidade.

2. Aquisição e Uso de Usinas de Etanol

A segunda fase da operação criminosa consistia na aquisição de usinas de etanol. O grupo é suspeito de ter comprado ao menos cinco dessas unidades no interior de São Paulo. Muitas dessas usinas estavam em situação de endividamento e foram reativadas com vultosos investimentos. Além de produzir o combustível que seria adulterado e distribuído pela rede, essas usinas desempenhavam um papel crucial na lavagem de dinheiro, efetuando pagamentos pela cana-de-açúcar que chegavam a ser 43% acima da média de mercado, uma prática que camuflava a origem ilícita dos recursos.

3. Estruturação de Distribuidoras Próprias

Para consolidar o esquema, a quadrilha estabeleceu suas próprias distribuidoras de combustíveis. Um exemplo notável é a empresa Duvale, localizada em Jardinópolis, São Paulo. A trajetória financeira da Duvale é um indicativo da dimensão da fraude: sem qualquer faturamento registrado até 2019, a empresa experimentou um crescimento explosivo, atingindo um faturamento de quase R$ 2,8 bilhões em 2021. Ela se tornou a principal destinatária do etanol produzido pelas usinas sob controle da organização criminosa. Parte substancial desses valores foi, posteriormente, repassada diretamente ao empresário Rafael Gineste, reforçando as suspeitas de sua participação central no esquema.

4. Rede de Transporte de Combustíveis Adulterados

A logística de distribuição do combustível adulterado era gerenciada por transportadoras cooptadas pelo grupo. A empresa G8Log, por exemplo, identificada como ligada a Mohamad Hussein Mourad, conhecido pelo apelido de “Primo”, utilizava sua frota de caminhões para escoar os produtos ilegais até os postos de revenda. Curiosamente, enquanto a G8Log operava no transporte de substâncias fraudulentas, seu empresário mantinha uma fachada pública, divulgando mensagens motivacionais nas redes sociais da própria transportadora, numa tentativa de disfarçar as atividades ilícitas.

5. Expansão para Postos de Revenda

A capilaridade da rede criminosa atingiu cerca de 1.200 postos de combustíveis espalhados por diversas cidades do Brasil. Nesses estabelecimentos, as fiscalizações da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) revelaram a extensão da fraude. Foram identificadas misturas ilegais de metanol na gasolina, com concentrações que chegavam a quase 50% em alguns casos. No etanol, a adulteração era ainda mais grave, alcançando até 90% de metanol, uma proporção extremamente perigosa e prejudicial.

6. Lavagem de Dinheiro via Fintechs

Para movimentar e ocultar os vultosos lucros obtidos com a fraude, a quadrilha utilizava fintechs. A BK Instituição de Pagamento, com sede em Barueri, São Paulo, desponta como a principal delas. Em um período de cinco anos, essa instituição foi responsável pela movimentação de impressionantes R$ 46 bilhões. A estratégia consistia no uso de contas denominadas “bolsão”, um mecanismo que dificultava significativamente o rastreamento da origem e do destino final do dinheiro, essencial para a lavagem dos recursos ilícitos.

7. Infiltração no Mercado Financeiro da Faria Lima

O ápice da sofisticação do esquema envolvia a infiltração no mercado financeiro, especificamente na Avenida Faria Lima, um dos principais centros financeiros de São Paulo. Neste local, a quadrilha empregava administradoras de fundos de investimento para converter o dinheiro proveniente das atividades criminosas em patrimônio aparentemente legalizado. A força-tarefa responsável pela investigação conseguiu identificar 42 fundos de investimento que estavam sob o controle direto da organização. Até o momento, a Justiça já determinou o bloqueio de R$ 30 bilhões vinculados a esses fundos, um valor que sublinha a magnitude da operação financeira ilícita.

Impacto da Fraude de Combustíveis no Brasil

A fraude de combustíveis, como a desvendada nesta operação, representa um grave risco para a sociedade e a economia brasileira. A adulteração com substâncias como o metanol não só danifica veículos, comprometendo a segurança dos motoristas e gerando prejuízos financeiros aos consumidores, mas também pode causar sérios problemas de saúde e ambientais. Além disso, a prática fomenta a concorrência desleal no mercado, prejudicando postos e distribuidoras que operam dentro da legalidade, e gera uma perda bilionária de arrecadação de impostos para o Estado. A infiltração do crime organizado em setores econômicos legítimos, como o de combustíveis, demonstra a complexidade e o desafio no combate a essas redes, que buscam legitimar seus lucros ilícitos e expandir seu poder.

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